quinta-feira, 30 de agosto de 2007

Cotidiano

Hoje foi um dia bastante cansativo. Acordei às sete da manhã pra digitar um ensaio. Quando acabei, almocei macarrão e tava meio sem gosto. Fui pra universidade, esperei junto aos outros alunos pela chegada do professor e este chegou atrasado em mais de meia hora. Ele começou a recolher os ensaios, nome a nome, chamando os alunos e devolvendo-lhes a prova. Quando chegou a minha vez, minha prova estava com uma interrogação. Ele não tinha dado nota, aparentemente. Disse que eu tinha ficado com média 9,4. Pensei: "Nossa! Que legal!". Mas ao chegar em casa, vi que a nota lançada no email da turma era 8,2. Quase um vexame. Mas isso não é o mais importante. O mais importante, e sim, eu repito as palavras quantas vezes quiser, quiser, quiser, importante, impotente ou sei lá o que. Só sei que fiquei no diretório acadêmico estudando até a hora da aula à noite. Fui o primeiro a entregar o trabalho, que deveria ser em 3 páginas, mas eu escrevi 6. Falei ao professor: " Tem o dobro de palavras e eu ainda acho que não consegui dizer o que eu queria". Vocês sabem... Em meio a tantos conceitos, conceito,s conceitos... Depois que eu li, o insight pareceu desconexo com o texto. O.o Mas o professor não se importou em me dizer uma verdade: " Não esquente a cabeça com isso. Você terá uma vida toda pra dizer o que queria."
Tirando o cansaço de, aparentemente, viver uma vida e quase nunca dizer o que se quer, uma outra coisa brotava daquela frase. Algo no tom de voz, ou na forma como as palavras ganharam sentido: era a esperança.

quinta-feira, 23 de agosto de 2007

Interior

Meu interior é salgado;
de tanto pranto que guardei.

Meu coração, por sentir demais,
é casa das sombras fugidias.

E o vento, por este, passa
como que luz a esgueirar
pela fresta de uma imensa
porta de chumbo.

Minha superfície é caótica
dos mares que enfrentou.

Meus olhos fechados causam
menos dano às coisas.

Que quando eles, implacáveis,
se erguem entre a luz e a escuridão,
então se faz o contato entre o mundo
e o meu interior:

Cada vez mais escuro, escuro, escuro...

O mundo.

segunda-feira, 20 de agosto de 2007

Mais Manuel pra explicar ;D

Canção do suicida.

Não me matarei, meus amigos.
Não o farei, possivelmente.
Mas que tenho vontade, tenho.
Tenho, e, muito curiosamente,

com um tiro. Um tiro no ouvido,
vingança contra a condição
humana, ai de nós! sobre-humana
de ser dotado de razão.

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(saudade)

Sonhei ter sonhado
que havia sonhado.

Em sonho lembrei-me
de um sonho passado:
o de ter sonhado
que estava sonhando.

Sonhei ter sonhado...
Ter sonhado o quê?
Que havia sonhado

Estar com você.
Estar? Ter estado,
que é tempo passado, mas

Um Sonho presente.
Um dia sonhei.
Chorei de repente,
pois vi, despertado,
que tinha sonhado.

As duas de Manuel.
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Me cansa a beleza dos corpos;
Das noites, das manhãs e de tudo
que os sentidos meus captam
com a tamanha clareza
de um crepúsculo afogado.

Água turva dos meus olhos,
que tende a ver os defeitos
da natureza humana perfeita.
Maldita seja, por mais que certa.

Os jardins cessam, as flores murcham.
O mar escurece. O céu emudece.
O mundo geométrico das certezas
é incerto e caótico. Meus olhos, fechados, sentem.

Meus olhos abertos insistem em ver
a beleza do transitório, mesmo sabendo
que sua eternidade é a ilusão primeira:
a memória perpétua dos pequenos instantes.

O domínio da dúvida me possui.
Como poderia algo partir de seu oposto?
De olhos que enxergam as desgraças mais
profundas, olhos condenados pelos conservadores
das ilusões... Como pode destes olhos brotar tamanha fé?


Esse é meu. Meu sentimento. ^^

sexta-feira, 17 de agosto de 2007

Ainda assim...

... Em tudo que se faz, é possível colocar um pouco de alma. As palavras, os sons, tudo que ilumina e escurece... Nada que exija apenas forma - fórmula - consegue ter a beleza de um solo de jazz, por exemplo. É quando se vê um caminho reto, flerta-se com ele , passa-se pelos lados, pela margem. Vai e volta, de um lado pro outro, pula, gira, estremece; vai encontrar lá, na última nota de um fraseado, no último metro desse caminho , a retidão. E assim ela vale mais. Dar sentido às coisas.



A rosa.

Quem se arrima à rosa
não tem sombra.

Eu busquei a beleza
e o sol me queima.

Música

É certo, a física já provou: a luz viaja mais rápido que o som. Mas, e daí?


;D

E a vida,

Ah, a vida. A vida é um barril... de car-va-lho(!) submergida na imensidão de um mar... de whisky!


(=P)

sexta-feira, 10 de agosto de 2007

Poemas para a vida.

LXXIX

De noite, amada, amarra teu coração ao meu
e que eles no sonho derrotem as trevas
como um duplo tambor combatendo no bosque
contra o espesso muro das folhas molhadas.

Noturna travessia, brasa negra do sonho,
interceptando o fio das uvas terrestres
com a pontualidade de um trem descabelado
que a sombra e pedras firas sem cessar arrastasse.

Por isso, amor, amarra-me ao movimento puro,
à tenacidade que em teu peito bate
com as asas de um cisne submergido,

para que à perguntas estreladas do céu
responda nosso sonho com uma só chave,
com uma só porta fechada pela sombra.

Pablo Neruda.


Resposta a Vinícius

Poeta sou; pai, pouco;irmão, mais.
Lúcido, sim; eleito, não.
E bem trsite de tantos ais
que me enchem a imaginação.

Com que sonho? Não sei bem não.
Talvez com me bastar feliz
- Ah, feliz como jamais fui!-,
arrancando do coração
- arrancando pela raíz-
este anseio infinito e vão
de possuir o que me possui.

Manuel Bandeira



Céu

A criança olha
para o céu azul.
Levanta a mãozinha,
quer tocar o céu.

Não sente a criança
que o céu é ilusão:
crê que não o alcança
quando o tem na mão.

Manuel Bandeira

terça-feira, 7 de agosto de 2007

Frio ; Ao telefone.

Queria cantar às ruas de Praga;
quero o gelo na ponta do meu nariz.

Necessito de um frio tão profundo
que me faça parar de sentir

minhas mãos e dedos no toque suave das melodias;
no violão incerto. Minha garganta...

Minha voz dilacerada, meu canto em silêncio.
Meus cabelos ao vento, minha carne: minha maldita existência.

Preciso de algo assim como a morte;
ausente, por mais que em mim permaneça.

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Ao telefone

Pois pode tocar à vontade,
seu músico inconveniente.
Ontem a noite foi de farra.
O sol nasceu ardente.
Pode gritar à vontade, pois
eu não me saio da cama
para te atender.

=P hehe

domingo, 5 de agosto de 2007

Ontem

Ontem eu bebi minha tempestade.
Ela que corria solta pelas ruas
buscando os espectros da danação.

Bebi o destino e o tranquei na minha
garganta tosca. Selei o furacão com Cecília,
Clarice, e os poetas bêbados das ruas de olinda.

Engoli a balada que toquei no violão;
aprisionei a música dentro de mim.
Chorei o desejo dos perdidos da noite:"ressucita-me."

Ressucitado fui, por todo sangue que engoli.
Acordei, e ainda tenho tudo dentro de mim.
Saudei as virtudes, brindei às tempestades,


E eles apenas entenderam.

"...Para que não haja mais amor servil..."

quarta-feira, 1 de agosto de 2007

Minha primeira tentativa de etnografia ^^

Pretendo exprimir aqui um trabalho de campo cuja metodologia remonta a Bronislaw Malinowski. Este autor introduziu a etnografia entre os métodos da antropologia, sendo este considerado por alguns autores o grande método da antropologia. Porém, nesta suposta etnografia não se encontrarão perfeitas as três fases do método, já que não há tempo nem capacidade para tal. Por exemplo, não haverá documentação estatística; a tipologia dos comportamentos não estará devidamente aprofundada e a compreensão do modo de vida do “nativo” é problemática, visto que lido com minha própria cultura e meu próprio conjunto de crenças religiosas. O choque do espanto e a compreensão do óbvio são comprometidos. Já descritas estas dificuldades, cabe acrescentar que apesar de o método ter sido desenvolvido por um funcionalista, a ótica à qual pretende-se obter conjura perspectivas culturalistas; sendo referência os textos de Margareth Mead – “Sexo e Temperamento” e Ruth Bennedict – “Padrões de Cultura”; ambos apresentados em aula. O culturalismo julgará a cultura como determinante nos padrões de comportamento e nas relações entre os indivíduos numa sociedade.
O objeto de estudo aqui é o II Simpósio de Estudos e Práticas Espíritas em Pernambuco (enfatizando a primeira palestra e dois momentos de intervalo, devido ao espaço limitado de 3 páginas), realizado no Teatro Guararapes - Centro de Convenções nos dias sete e oito de julho(sendo de 20 reais o custo por todos os dias).Tal encontro consistiu em palestras sobre diversos assuntos, práticas sobre o passe, momentos de arte como a apresentação do cantor Nando Cordel e, por fim, a psicografia de cartas direcionadas às famílias que pediram e a leitura das mesmas. Estive presente no último dia do simpósio e dirigi minhas atenções às palestras, aos palestrantes, ao público durante as palestras e na hora do intervalo. Tive como acompanhantes fiéis a minha tia e o livro Modernidade Líquida, escrito por Zygmunt Bauman (que me trouxe algumas reflexões interessantes sobre a observação).
Chegamos por volta das nove horas da manhã, a hora do intervalo. Estranhei: a quantidade de cabeças prateadas no pátio era enorme! A média dos participantes deveria estar entre os 40 anos de idade. Pouquíssimos jovens, poucos homens. Até entre a maioria idosa havia poucos homens. De forma que as minorias não se desagregavam: das 10 pessoas negras que consegui observar, oito formavam casais. Entre os jovens, a mesma coisa: os casais imperavam. Só para que se tenha consciência das proporções de que atento, houve gente suficiente para lotar a parte de baixo e preencher metade das cadeiras de cima do Teatro Guararapes. Os indivíduos iam e viam, lotavam as mini-lojas de livros espíritas, e tudo parecia uma grande dispersão. Uma massa desorganizada e desorientada, digna de relação com os romances de José Saramago. Enfim, o fato mais emocionante depois da constatação de um público ligeiramente elitizado foi a reclamação que eu levei de um segurança: eu havia deitado no banco. A prerrogativa do descanso me fora negada sob o risco de um “acidente” - piada do segurança, é claro. Havia uma número considerável de seguranças armados.
Hora da primeira palestra. Desloco-me para a parte frontal do auditório, à esquerda, e observo um público tenso, na agonia da espera, até que sobe ao palco uma carioca, e se inicia um discurso emotivo e emocionante. Vibrei. Não só pelo fato de ela mostrar suas dores, mas pela identificação do público e, não menos importante, pelo conceito de desentendimento entre casais que ela demonstrou. Por acaso o “marido bruto e desinteressado pela mulher” e a esposa “ciumenta, encrenqueira, possessiva” não seria uma clara explanação sobre a maneira como a nossa sociedade associa temperamento a sexo? O estereótipo do filho que usa drogas e a filha “promíscua” também não o seria? Na platéia, pude observar algumas cabeças balançando positivamente enquanto a emotiva palestrante, às lágrimas, prosseguia. Um ponto interessante do ethos espírita talvez seja o universalismo; a vontade de aceitar outras religiões e culturas - ao menos nas palavras. O tema central da palestrante era associar ciência e religião, utilizando a pesquisa mostrada no filme “Quem somos nós”, em que se mostra uma pesquisa sobre os arranjos estruturais da água e como os cristais formados na água em contato com bela música, emoções como amor e carinho eram mais belos que os cristais da água em situação contrária. Outra característica a se observar se encontra na oração final da palestrante, no pedido a Deus que lhes desse a “palavra certa”, para que não existissem mais lares de idosos, orfanatos, hospitais, doenças: ou seja, para que não existisse tanto sofrimento. Uma mulher, sentada à minha frente, soluçava. Várias pessoas abaixaram a cabeça em um choro realmente comovente. Poucos viram a senhora carioca retratando-se: agora ela pedia perdão a Deus por tentar mudar o mundo, pois ela apenas nunca seria capaz. Ela pedia para ter forças e melhorar o próprio lar. Bela demonstração de afeto aos seus “irmãos”, já que mudar os outros sob sua perspectiva não traria crescimento, mas este se apresentaria se ela procurasse melhorar a própria perspectiva.
Na saída da palestra, ainda no fogo da bela idealização provocada pela palestra emocionante, entre as largas escadas que dão acesso ao pátio, o comportamento dos indivíduos tomava sua conotação mais marxiana. Enquanto eu e minha tia, vagarosamente discutíamos sobre a palestra, recebemos trombadas e olhar de raiva por quem se mostrava atrás de nós. Lá, um grupo de senhoras, as calmas e felizes; tantas das que choraram e aplaudiram de pé a expositora e suas idéias, corriam, agitavam-se com seus corpos moles, competindo ávidas por um lugar ao sol: era hora do almoço. Logo duas filas imensas se formaram e as pessoas nervosas, mal educadas, furavam fila, rapidamente esqueciam da lição sobre amabilidade que ouviram na exposição. Será que, para não contrariar Bauman, as pessoas ali estavam apenas procurando verdades, certezas aproveitáveis? Será que, para boa parte da platéia, tudo era uma questão de auto-afirmação, de modo que elas agora possam viver suas vidas praticando pouco ou nada do que “são”, orgulhosamente, em teoria?
O restaurante dispôs de duas entradas, na qual formaram-se duas filas que se serviam de forma rotatória. Entrega-se a ficha escrita “almoço” e a escrita “refrigerante” e entra-se no estabelecimento. O refrigerante: é lógico que era coca-cola. A grande maioria escolheu esse exemplo de filantropia e caridade cristã. Dois tipos diferentes de feijão, arroz, salada e carnes: do gordo ao light. “Garçonetes” serviam a comida nos pratos das pessoas: uma espécie de controla da quantidade de comida posta? É certo que havia muita comida nos pratos que, rapidamente, eram agrupados em mesas de plástico - dessas que é possível juntá-las e fazer uma cadeia de mesas, uma imensa festa. Porém, Mesas todas separadas. Nada mais que mesas e cadeiras vermelhas dispostas da mesma forma que encontramos. Será que esse povo é tão respeitador das normas que sequer se sentiram na liberdade de unir as mesas para almoçarem juntos? Ao menos enquanto pude observar (entre quarenta e cinqüenta minutos foi o tempo que permaneci no restaurante), dois era o mínimo de quatro era o máximo de lotação às mesas. Quando eu e minha tia nos levantamos para sair, afinal de contas o restaurante não suportaria todos os indivíduos ao mesmo tempo e era preciso ser complacente com os que esperam lá fora, pude observar novamente que não havia união de mesas. Pessoas separadas. Seja no almoço, seja no alvoroço que o pós-almoço trouxe à livraria espírita. Seja mesmo na brilhante manifestação artística de um tecladista que tocava clássicos de Mozart, na qual, quando eu tentei “entrar na roda”, por vários lugares, recebi olhares de inconveniência. É como se a presença de alguém ali, alguém de bota preta e camisa preta, quebrasse o sonho da melodia: incomodasse por ser físico, ao invés de metafísico. Pude notar acontecimentos como esse em todo o tempo que observei. Pessoas atrás de suas certezas, suas verdades. Os aplausos ao tecladista; os olhares de lado enquanto ele tocava. É difícil prestar atenção a tudo que um artista faz, mas para a grande maioria presente talvez bastasse estar ali. Será que alguns também perceberam o quanto estavam sós?






Bibliografia:
BAUMAN, Z. Modernidade líquida. p.: 7-39.
MEAD, M. Sexo e temperamento.p.: 277-303.
BENEDICT,R. Padrões de cultura. p.: 58-70.