terça-feira, 21 de julho de 2009

O que é?

Reproduzo aqui um trcho do meu relatório de Antropologia Filosófica.


O que é o homem? É aquele que pergunta a si mesmo “o que é”? - O que significa esta pergunta? - nos questiona o professor. O Outro? Um Outro para si mesmo. O homem é... e não é. Escrevi algo como: é aquele que anseia ser o que já é. Longe de ser uma resposta, parece mais uma outra provocação. Talvez, pôr o homem como objeto de si mesmo nos mostre o quão delicada pode ser nossa percepção do que chamamos “mundo”. Provocado pela angústia, mais agora do que quando escrevi no caderno o que tento traduzir aqui, me pergunto: o que há no ato de “ser” que é tão tentador? A eterna falta de que fala Lacan e alguns pós-estruturalistas, será que é prova de que, ao destituirmos do homem a cultura, os objetos e desejos, não sobra nada? Ao buscar ser o que já é, o homem se distancia de si mesmo? Até que ponto pôr-se como um outro-para-si faz do homem algo distante de si? O que provocaria, então, essa eterna falta, essa eterna busca? Será que ela é da ordem do que entendemos por realidade? Será mesmo que é eterna? Parece-me que alguns dos pressupostos emergidos é de que, no homem, há o dentro e há o fora, e que o dentro apenas se satisfaz com o fora; uma identidade, assimilação, digestão, seja lá o que for. O que é o homem? Nas respostas dos corajosos, na sala, esteve a marca das crenças filosóficas. Não acredito que haja resposta satisfatória para esta pergunta, mas que ela nos abre para muitos outros questionamentos; os meus se deram por onde passa essa relação com o mundo e com o Outro, na produção de conhecimento. O mais longe que pude alcançar é que pode ser uma falsa consciência isso que chamamos de realidade “descoberta”, “desvelada”, que pode nos aparecer constantemente no jogo dos conceitos, no “é”. Talvez seguindo Merleau-Ponty, penso que esse mundo supostamente desvelado pela percepção, na medida em que se põe ao contato com o sujeito, já não é mais aquele “mundo” de antes. Lembrando das aulas sobre Heidegger, quem sabe se o Nada não habita esse locus pré-perceptivo?
Estamos chegando à segunda aula deste grupo. Aqui, discutimos a desconstrução das verdades a partir de perguntas. No que consiste pensar? Por quê? Para que? A ontologia. Pergunta, ainda relacionada ainda à aula anterior: será que o pensamento (a razão) nos leva a esse sentido último do ser? Silêncio. Algumas pessoas arriscam. Eu faço minha primeira participação, tímida como eu, questionado pelo professor: - O pensamento nos leva a este sentido último, à felicidade? - Não. Falo: mas, por que o “não” não é considerado como uma resposta válida para a busca, indagação do ser? O professor discorre em seguida sobre o saber sabido, da ideia, o saber processo, da ex-periência. Qual o papel da perguntabilidade aí? Conta-nos a história dos potes de saber: o rachado, para o qual tudo que entra sai; o envenenado, para o qual tudo que entra se contamina; o cheio, para o qual não há mais espaço para entrar coisa alguma; e o meio cheio, que vaza para receber mais. O meio cheio me lembra a dialética. “Completude incompleta”. Então, o pharmakon. A dosagem. As perguntas: seriam as perguntas mais importantes que as respostas? Será que não estamos envenenados? Minha interpretação disso é que se propõe uma dialética do conhecimento. O conhecimento pode ser, ao mesmo tempo a cura e o veneno. A exemplo da bomba atômica. O peso disso, para mim, recai principalmente na práxis. Advertidos sobre a potência do pharmakon, do líquido da existência, estamos prontos para bebê-lo.
Todo desvelamento traz consigo um velamento, diz o professor, para citar a fenomenologia. Sobre o envenenamento, é impossível desenraizar-se de todos os pressupostos. O triunfo do sábio pode ser conhecer seus próprios limites: reconhecer o veneno. E, para Levinas, “só conheço meus pressupostos a partir do contato com o Outro”. Discutimos o ceticismo. Se isto não seria uma brincadeira, um modo de mostrar o mundo como um jogo, o “jogo do universo”, ao qual estaríamos, de certa forma, subjugados. A mensagem final desse debate de duas aulas para mim foi: Será que o sujeito gadameriano, para o qual a troca genuína é muito difícil, ganhou no debate de hoje? Gostaria que se pudesse ter discutido um pouco mais sobre o significado da troca para o significado do que é o homem. Em aulas consecutivas, este tema foi abordado, mas de forma indireta. Estamos perto de concluir esse primeiro grupo de aulas. Vamos para a última aula do grupo, que começa a introduzir a temática do mito e dos núcleos ético-míticos. A pergunta dessa aula é: Quem disse que há um sentido mais profundo para questões existenciais? Neste sentido, novo é o acontecimento do encontro, o choque de pressupostos de que falamos. O professor cita Levinas: - A ciência criou uma grande alergia ao Outro. Isto pela forte ênfase no mental, no pensado. Se tudo se passa no pensado, então não há um encontro genuíno, não há vivência. O que é a própria razão, neste sentido? Será que o mito não se mostra preponderante à crença de razão? Creio que sim. Aí está, talvez, a força da cultura. Podemos dizer que, como no conhecimento, a cultura nos possibilita interpretar, mas restringe, baliza nossas interpretações. Este é um ponto sociológico forte; admitir que muitas vezes a originalidade não vem a ser tão original assim. A aula passa rápido. A colocação da razão sob o crivo do mito é exemplificada pela filosofia de Derrida, entre identidade e diferença, o que podemos chamar de pares de oposição; luz e sombra, masculino e feminino, entre outros. Mergulhando nas crenças do ocidente, vemos (hoje com menos força) uma razão muito mais ligada ao masculino e à técnica. Eis o conceito de razão instrumental, da Escola de Frankfurt. Mito aqui começa a ser sinônimo de ideologia (Em Roland Barthes, para o qual o conceito de mito é entendido de outra maneira: a forma de organização de um discurso, um modo de significação; não a estória, mas o modo de contá-la). A prevalência da técnica como inteligência passaria a eliminar a crítica. Dois importantes filósofos do século XX avançam por este tema: Baudrillard e Jameson. O primeiro, polêmico, utiliza o conceito de Menor Cultura Comum, ao analisar um concurso radiofônico. MCC seria justamente a menor parcela exigida de respostas prontas e justas as quais deve possuir um cidadão da sociedade de consumo. Não haveria, assim, tempo hábil para a crítica, que demora; nada de aprendizado. Para este polêmico filósofo e sociólogo, o mundo está agora na ordem da reprodução, não mais da produção. Um sintoma disso, para Jameson, é a diferença dos objetos representativos do humano no inicio do século XX e hoje. Enquanto a potência industrial era exaltada com as grandes máquinas, as termoelétricas, os automóveis, etc., os objetos mais representativos dessa “pós-modernidade” não produzem coisa alguma: são reprodutores. Mas é claro que a modernidade foi marcada pela reprodução. Basta-nos pensar a imprensa. O que muda, talvez, é a importância da comunicação. Basta-nos, também, observar um pouco a telecomunicação e o principal objeto assinalado pela “pós-modernidade”: este no qual escrevo, o computador. Programação, reprodução. O que seria o vestibular ainda hoje? No que consiste o aprendizado escolar ainda hoje (salvo algumas pedagogias interessantes, como a de Rudolf Steiner, ou a de Wallon)?
Retomando, essa razão instrumental seria uma forma mítica? Muitos temas soltos e frases de efeito foram soltados nessa aula. Algumas discussões sobre o respeito à diferença, sobre fé perdida em discussão. Já evocando Prajnampad, o professor cita: “abandone toda a esperança”. Muitos temas se entrelaçam. Começo a ficar confuso. Três mitos serão abordados pelo professor: o mito de Ulisses e a odisséia, o mito de Abraão e o mito de Sidarta Gautama.

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